sexta-feira, 28 de março de 2014

A identidade docente: constantes e desafios

Por Carlos Marcelo, Professor Catedrático de Didática e Organização Escolar da Universidade de Sevilha, na Espanha

Tradução: Cristina Antunes

“A melhoria na qualidade do ensino requer bons professores. Docentes comprometidos com a difícil tarefa de ensinar que, por sua vez, exige dos profissionais sentido e responsabilidade. A identidade profissional docente se constitui como uma interação entre a pessoa e suas experiências individuais e profissionais. A identidade se constrói e se transmite. E existem algumas características ou constantes da identidade profissional docente que se repetem e que são, geralmente, independentes do contexto social ou cultural. Neste artigo, discutimos essas características da profissão docente que lhes garantem identidade.


Percebemos que nossas sociedades estão mudando. Uma transformação não planejada que está afetando a forma como nos organizamos, como trabalhamos, como nos relacionamos e como aprendemos. Essas mudanças têm um reflexo visível na escola como instituição encarregada de formar os novos cidadãos. (Carlos Marcelo, 2002).

Uma das características da sociedade em que vivemos tem relação com o fato de que o conhecimento é um dos principais valores de seus cidadãos. O valor das sociedades atuais está diretamente relacionado com o nível de formação de seus cidadãos e da capacidade de inovação e empreendimento que eles possuam. Mas, em nossos dias, os conhecimentos têm data de validade, e isso nos obriga, agora mais que nunca, a estabelecer garantias formais e informais para que os cidadãos e profissionais atualizem constantemente sua competência. Ingressamos numa sociedade que exige dos profissionais uma permanente atividade de formação e aprendizagem.

No que essas mudanças afetam os docentes e sua identidade como profissionais? Como devemos repensar o trabalho do professor nessas novas circunstâncias? Relatórios internacionais recentes voltaram a focar e destacar o importante papel que os professores desempenham em relação às possibilidades de aprendizagem dos alunos. O próprio título do relatório que a OCDE publicou recentemente nos chama a atenção: Teachers matter: attracting, developing and retaining effective teachers (OCDE, 2005) 1. Afirma-se no título que os professores devem ser levados em conta, são importantes para ajudar a melhorar a qualidade do ensino que os alunos recebem. Nesse relatório afirma-se que: “Existe atualmente um volume considerável de pesquisa que indica que a qualidade dos professores e de seu ensino é o fator mais importante para explicar os resultados dos alunos. Existem também consideráveis evidências de que os professores variam em sua eficácia. As diferenças entre os resultados dos alunos às vezes são maiores dentro da própria escola do que entre escolas. O ensino é um trabalho exigente, e não é possível para qualquer um ser um professor eficaz e manter essa eficácia ao longo do tempo” (12). Esse relatório vem mostrar a preocupação internacional em relação ao magistério, às formas para tornar a docência uma profissão atraente, a como manter melhores professores no ensino, e a como conseguir que os professores continuem aprendendo ao longo de sua carreira.

Esse relatório da OCDE vem evidenciar que os professores são importantes. Importantes para influir na aprendizagem dos alunos. Importantes para melhorar a qualidade da educação que as escolas e os estabelecimentos de ensino realizam cotidianamente. Importantes, em última análise, como uma profissão necessária e imprescindível para a sociedade do conhecimento. E visto que os professores são fundamentais, precisamos que nossos sistemas educativos sejam capazes de atrair os melhores candidatos para se tornarem docentes. Necessitamos de boas políticas para que a formação inicial desses professores lhes assegure as competências que vão precisar durante sua longa, flexível e variada trajetória profissional. E a sociedade necessita de bons professores, cuja prática profissional cumpra os padrões profissionais de excelência que assegure o compromisso do respeito ao direito que os alunos têm de aprender.

Paralelamente ao estudo da OCDE, a influente Associação Americana de Pesquisa Educacional _ tornou público o relatório que pretende sintetizar os resultados da pesquisa sobre a formação docente, assim como propor políticas educativas conformes com esses resultados. Afirma-se que: _“em toda a nação existe um consenso emergente acerca de que os professores influem de maneira significativa na aprendizagem dos alunos e na eficácia da escola” (M. Cochran-Smith & Fries, 2005, p.40). Na mesma linha, Daling-Hammond (2000) viria a afirmar que a aprendizagem dos alunos “depende principalmente do que os professores sabem e do que podem fazer”.

Porém não basta destacar a importância do papel do docente. Chapman e Aspin (2001), editores do International Handbook of Lifelong Learning (Manual Internacional de Educação Continuada), expunham a necessidade de se realizar profundas transformações nos sistemas educacionais atuais para que possamos enfrentar os desafios da sociedade do conhecimento. Esses autores apresentam uma série de princípios que nos parece serem de interesse:

A necessidade de oferecer oportunidades educativas que respondam aos princípios de: eficácia econômica, justiça social, inclusão social, participação democrática e desenvolvimento pessoal.
A necessidade de reavaliar os currículos tradicionais e as maneiras de ensinar em resposta aos desafios educacionais produzidos pelas mudanças econômicas e sociais e pelas tendências associadas ao surgimento de uma economia do conhecimento e de uma sociedade da aprendizagem.
A reavaliação e redefinição dos lugares onde a aprendizagem acontece, assim como a criação de ambientes de aprendizagem flexíveis, que sejam positivos, estimulantes e motivadores, e que superem as limitações de currículos padronizados, da divisão por matérias, dos tempos curtos e das rígidas pedagogias.

Uma aceitação da importância do valor agregado que proporciona a aprendizagem.
A consciência de que embora se comece a perceber que a escola não é a principal fonte de aquisição de conhecimento, ela está se convertendo em instituição fundamental na socialização da população jovem.
A ideia de que os caminhos de aprendizagem entre as escolas e as instituições de ensino superior, os trabalhadores desse setor e outros provedores de educação, terão um alto impacto na formação de relações entre a escola e a comunidade.
A necessidade de promover a ideia da escola como comunidade de aprendizagem e como centros de aprendizagem ao longo da vida.

Reivindica-se, por tanto, um professor compreendido como um “operário do conhecimento”, desenhista de ambientes de aprendizagem, com capacidade para rentabilizar os diferentes espaços onde se produz o conhecimento. E também uma profissão docente caracterizada pelo que Shulman (1998) denominou uma comunidade de prática através da qual “a experiência individual possa se converter em coletiva” (521). Uma profissão que necessita mudar a sua cultura profissional marcada pelo isolamento e pelas dificuldades para aprender de outros e com outros, na qual é mal visto pedir ajuda ou reconhecer dificuldades.

Por outro lado, as evidências dos relatórios internacionais mostram que as políticas de reforma educacional executadas em muitos países deterioraram as condições de trabalho dos docentes, causando desmoralização, abandono da profissão e absentismo, tendo, tudo isso, um impacto negativo na qualidade da educação que se oferece aos alunos. Como afirmam Day, Elliott e Kington, “os professores estão deixando de lado o que consideram parte essencial de seu trabalho, a interação com os alunos, para abordar as prioridades de gestão e de avaliação” (Day, Elliot, & Kington, 2005). Há evidências em relação ao fato de que as mudanças nas condições internas e externas das escolas produziram condições de extrema incerteza e crise de identidade dentro do que historicamente foi, para muitos professores, uma profissão estável (Day, Elliot, & Kington, 2005)”.



Fonte: www.formacaodocente.autenticaeditora.com.br

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Prece de um professor:


Jesus,Mestre Amado,permite que eu, Mestre na terra.

Honre a verdade caridosa do Teu exemplo.

Ensina-me o caminho do conhecimento,

mas, sobretudo, a simplicidade generosa do sábio.

Mostra-me Senhor o equilíbrio que deve existir

entre a bondade que afaga e energia que corrige.

Ampara-me, fortifica minha vontade,

socorra-me na vacilação da minha inteligência.

Faze-me escravo mesmo de Tua Perfeição

para que meus discípulos sejam maiores do eu sou.

Abre meu coração, Mestre, lá dentro guarda a esperança

e meu trabalho,todos os dias, será uma vitória,

apesar da incompreensão de alguns ou da indiferença de todos.

Abranda minha ânsia em querer tudo onde pouco existe,

já que a constância do Bem faz sua própria colheita.

Concede-me a modéstia para saber que não tenho riquezas para dar,

mas que poderei ensinar a cada um descobrir seus próprios tesouros.

Dá-me um gesto amigo para fazer de meu discípulo um amigo,

mas arranca de mim, eu te suplico, a injustiça que mata,

a prepotência, o orgulho vão, a mentira que, já no principio,

apunhala uma vida que será, também, um pouco da minha vida.

Mestre Jesus, que eu possa, afinal, bem cumprir a tarefa

e que meus discípulos recebam, pela minha palavra,

a Benção da Tua Verdade, Sabedoria e Amor.

Autor: Wandelli Peçanha