Saúde e doença são
temas tradicionais do ensino formal. Na prática, o professor assume o papel de
educador em saúde ao desenvolver com seus alunos o conteúdo curricular ou ao
atender às situações concretas do cotidiano escolar: projetos, campanhas,
ocorrência de casos de doença, epidemias, necessidades emergentes dos alunos e
da coletividade em que a escola está inserida. Contudo, a importância da
formação escolar vai muito além das respostas aos problemas concretos e até
mesmo das atividades organizadas em torno do tema.
As contribuições da
escola para a saúde são essenciais e múltiplas: participa decisivamente na
formação cultural, está na base da preparação para o mundo do trabalho, traz
conhecimentos específicos que cada uma das disciplinas aborda em relação à
saúde e constitui-se em espaço privilegiado das vivências da infância e da
adolescência (Martinez, 1996).
Sabemos que a
educação escolar possibilita-nos abrir os horizontes da valorização e da
qualidade de vida, contribuindo para o desenvolvimento da criatividade e a
ampliação da autonomia. A escola pode incentivar a riqueza de interesses e
ampliar a flexibilidade para encontrar alternativas nas situações de tensão e
conflito, enriquecendo decisivamente a elaboração de projetos pessoais nos
quais o sujeito possa apoiar-se para enfrentar a vida.
Na realidade, todos
os professores estão fazendo opções em relação à saúde, assim como em relação
às demais questões sociais, ao selecionarem conteúdos e veicularem conceitos e
valores em suas aulas, ao elegerem critérios de avaliação, bem como pela
metodologia de trabalho que adotam e pelas situações didáticas que propõem aos
alunos.
Isso ocorre porque
o processo de ensino e aprendizagem envolve uma determinada concepção do mundo
e da forma como vivemos nele. Quando nos conscientizamos desse fato, damos um
passo decisivo no sentido de optar claramente sobre o que ensinar e para que
educar. Essa importante reflexão vem à tona no momento em que definimos os
chamados temas transversais do currículo: as questões que, por sua urgência e
relevância social, são consideradas significativas na vivência escolar e devem
permear a abordagem do conteúdo de todas as áreas do conhecimento.
A proposta
metodológica de tratar a saúde de maneira transversal é um recurso para
organizar o trabalho didático, de forma a incorporar os objetivos e conteúdos
do tema ao conjunto da ação pedagógica. Podemos considerar que o estudo da
qualidade de vida dos povos e a distribuição de doenças no tempo e no espaço são
conteúdos presentes nas aulas de História e Geografia. Da mesma maneira, os
textos utilizados no aprendizado de línguas e os problemas formulados nas aulas
de Matemática trazem mensagens sobre as relações humanas, e, portanto, refletir
sobre elas é um dos caminhos para realizar a transversalidade. Observa-se,
ainda, que a participação de alunos que não sejam habilidosos esportistas nas
aulas de Educação Física e a promoção de seu convívio ativo no grupo, e não
apenas como espectadores dos “melhores”, produzem impacto muito maior sobre a
saúde do que as longas palestras sobre a importância da prática regular de
atividades físicas.
Nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (Brasil, 1998), a cidadania é considerada o eixo da
educação escolar, o que implica eleger determinados princípios que orientam a
vida em sociedade e agir para a afirmação destes. No contexto dos princípios
democráticos — dignidade da pessoa humana, igualdade de direitos, participação
e co-responsabilidade pela vida social —, a educação cidadã concorre para a
compreensão da saúde como direito. Mais do que isso, promove o exercício desse
direito através da capacitação para agir, individual e coletivamente, sobre os
fatores que condicionam a saúde: o cuidado de si e dos demais, a oferta e o uso
dos serviços de saúde, as condições socioculturais e econômicas que determinam
a qualidade de vida.
Enfim, a educação
para a saúde ganha novo sentido para a escola e para a vida quando assumimos
que não somos entidades biológicas, mas culturais e sociais.
Da mesma forma que,
ao longo do tempo, a visão do processo de ensino–aprendizagem transformou-se,
modificaram-se também as concepções de saúde e de promoção da saúde.
Valorizamos cada vez mais os laços entre saúde e qualidade de vida individual e
coletiva. Ao educar para a saúde, nosso objetivo não é mais a ênfase no
conhecimento teórico do corpo humano, pois essa opção não se mostrou suficiente
para fomentar a adoção de comportamentos e atitudes saudáveis. O foco
desloca-se para a promoção do desejo, do empenho e da capacidade para cuidar de
um corpo real.
No que tange à vida
reprodutiva, por exemplo, nossa expectativa não é ter alunos capazes de
discorrer sobre métodos anticoncepcionais, mas, sim, procurar oferecer-lhes
elementos para que possam, se quiserem, optar por sua utilização para ter os
filhos desejados, no momento desejado. Da mesma forma, com relação à Aids, não
é suficiente saber as formas de transmissão do vírus — o HIV. O conteúdo
essencial da educação está no conhecimento e na valorização do uso de medidas
eficazes para prevenir a transmissão do vírus, no empenho em cuidar de si e dos
demais.
Sabemos que a real
importância dos temas transversais está na sua contextualização, pois o
significado que tais temas têm no dia-a-dia possibilita a participação ativa
dos educandos no processo de aprendizagem, potencializando a aplicação da
experiência escolar às demais situações da vida.
Em nenhum momento
cogitou-se a hipótese de que a escola colocasse em segundo plano sua tarefa
específica de educação para abordar as questões de saúde, por mais relevantes
que estas sejam, visto que seria incoerente com a proposta de tratar a saúde
como tema transversal. Sendo uma questão que permeia o conjunto da experiência
escolar, a educação para a saúde realiza-se com o auxílio das mais diferentes
áreas do conhecimento, através dos seus conceitos e informações e,
principalmente, através dos valores veiculados no processo de ensino e
aprendizagem. Uma abordagem isolada do tema seria incoerente até mesmo com a
maneira como compreendemos o processo saúde–doença.
A saúde, entendida
como um processo qualitativo que diz respeito ao funcionamento integral do
organismo — somático e psíquico, biológico e social — não é mais entendida como
sinônimo de ausência de doença. Caminhar em direção à saúde é promover meios
para que cada indivíduo possa traçar um caminho pessoal e original em direção
ao bem-estar físico, psíquico e social, participando ativamente do controle
sobre as condições de saúde da sociedade. Para isso, faz-se necessário o
desenvolvimento de um conjunto de recursos objetivos e subjetivos, que permita
ao sujeito estabelecer uma inter-relação positiva com a situação social em que
vive e com as contradições e dificuldades enfrentadas no cotidiano. A saúde
implica, portanto, a valorização da vitalidade física, mental e social para a
atuação frente às permanentes transformações pessoais e sociais, frente aos
desafios e conflitos (Dejours, 1986).
Reconhecendo que os
componentes da saúde dizem respeito a muito mais do que a biologia do corpo
humano, os educadores e os profissionais de saúde perceberam que a abordagem
técnica tradicionalmente utilizada não dá conta das necessidades atuais. Gera,
ao contrário, um forte sentimento de frustração, quando fazemos uma avaliação
dos resultados de nossas “ações educativas”, já que falamos, fazemos e pouco
vemos o resultado de nossos esforços.
Temos urgência em
ampliar e otimizar os recursos para diminuir a vulnerabilidade das pessoas e da
sociedade aos processos causadores da enfermidade, pois a cada dia surgem novos
desafios, e o resgate dos antigos conhecimentos mostra-se insuficiente. Além da
diversidade humana, da crise de valores, da alteração do quadro de problemas de
saúde, é necessário considerar que os hábitos e os estilos de vida mudaram ao
longo dos anos. Numa época em que predominam a valorização exclusiva do
presente e a relativização de todo conhecimento e valor, o que efetivamente
significa educar para a saúde e para a vida?
Quando
compreendemos os fatores que influem nas atitudes e práticas favoráveis à vida
e à saúde, percebemos também que interferir sobre a situação de saúde e a
ocorrência de doenças é algo possível para todos. Por isso, o processo
educativo em saúde requer a adoção de estratégias de ensino–aprendizagem que
possibilitem ao aluno construir e incorporar conhecimentos, e não apenas
decorar conceitos. É necessário formular e resolver problemas, gerando
oportunidades ao desenvolvimento de atitudes e à utilização prática dos
conhecimentos adquiridos. Os novos saberes precisam adquirir sentido para que
se integrem e participem ativamente do sistema de regulação do comportamento do
sujeito, incorporando-se à reflexão e à ação. O potencial da educação escolar
reside, exatamente, na articulação dos conhecimentos, das atitudes, das
aptidões e das práticas que possam ser vivenciados e compartilhados com a
sociedade.
Em outras palavras,
a educação para a saúde só se concretizará se puder contribuir para o
crescimento da capacidade de fazer escolhas e para a ampliação das potencialidades
pessoais e sociais, traduzidas em atitudes e práticas favoráveis à vida e à
conquista de qualidade de vida dos indivíduos e da coletividade.
A saúde, como um
tema transversal, valoriza o significado social dos procedimentos e conceitos
próprios das áreas convencionais, relacionadas às questões da realidade e
ampliando o valor da escola e do professor na formação integral dos cidadãos
(Brasil, 1998).
EDUCAÇÃO EM SAÚDE É
QUALIDADE DE VIDA
O projeto Saúde na
Escola busca gerar oportunidades de reflexão e atuação sobre as questões de
saúde colocadas no presente.
Sob esse prisma, os
vídeos e textos de apoio podem auxiliar o trabalho pedagógico em diversos
sentidos: despertar a atenção para o tema, trazer novos elementos para a
percepção e a compreensão dos fatos, motivar os trabalhos escolares, auxiliar a
formação de conceitos, hábitos e atitudes. Podem ainda ser utilizados em
projetos ou atividades de integração da escola com a comunidade, cumprindo seu
papel, na medida em que contribuam efetivamente para a ação educativa
planejada.
Portanto, a
recepção dos vídeos, através da TV Escola, e a produção de cópias são
essenciais para que o professor utilize o material no momento oportuno, de
acordo com a programação de cada Unidade de Ensino.
O vídeo é, sem
dúvida, uma ferramenta poderosa para a prática pedagógica. Entretanto, ele não
é um fim em si mesmo. É apenas um meio de informação, motivação ou
sensibilização. Daí a importância de organizarmos atividades que permitam que
os alunos se apropriem, questionem, reconstruam as mensagens veiculadas. Alguns
exemplos podem servir de inspiração para o professor criar suas próprias
atividades, de acordo com a realidade de sua escola:
Vídeo: depois de
assistir ao vídeo com os alunos, identificar as mensagens que foram mais
marcantes para cada um e para o grupo, promovendo um debate; identificar termos
desconhecidos e conteúdos a serem aprofundados, buscando novas fontes de
informação; desenhar cenas dos vídeos; construir uma história (oral ou escrita)
a partir de uma frase sugestiva.
Música: lembrar,
com os alunos, de músicas que falem sobre os temas abordados, relacionando
cultura e saúde; sugerir que os alunos façam composições sobre os conteúdos
mais polêmicos ou significativos.
Literatura e
cultura popular: trabalhar com os alunos textos de literatura (poesia e prosa)
e de cultura popular que abordem temas relacionados à saúde; pesquisar ditados
populares relacionados às situações apresentadas.
Mídia: identificar
anúncios em jornal, revista, televisão ou rádio que falem sobre saúde,
analisando criticamente suas mensagens diretas e subliminares.
Cotidiano/comportamento:
descobrir, na família, como eram os hábitos e costumes de outras gerações;
realizar pesquisas sobre valores e comportamentos predominantes em diferentes
culturas.
Atividades
envolvendo mais de uma turma da escola: organizar feiras; construir horta e
pomar na escola ou em espaço comunitário; realizar concursos de frases,
desenhos ou composições; promover gincanas; montar peças de teatro ou quadros
de mural, abordando os assuntos de maior interesse.
A utilização dos
vídeos e textos de apoio poderá trazer algumas propostas e respostas e levar à
formulação de muitas novas perguntas. A experiência educativa e a formação
continuada serão indispensáveis para realimentar esse processo. Feliz ou
infelizmente, não há receitas prontas e efetivas de vida saudável, muito menos
que sirvam para todos, indistintamente. Por isso, a atualização precisa ser um
trabalho contínuo, que privilegie a participação coletiva e multidisciplinar e
que possibilite a análise crítica, a colaboração mútua e o intercâmbio de
experiências.
As seguintes
referências podem ser utilizadas como apoio para o trabalho educativo:
Os Parâmetros
Curriculares Nacionais — em particular, os livros dedicados aos temas
transversais — podem ser utilizados para o aprofundamento dos debates e como
subsídio para o planejamento escolar. Eles podem ser acessados também pela
página do MEC na Internet (www.mec.gov.br). Muitas escolas e Secretarias de Educação
dos estados e municípios brasileiros vêm trabalhando na formulação de
referenciais para o trabalho educativo no tema.
A identificação dos
serviços de saúde existentes na comunidade em que a escola se insere e o
contato permanente com eles são recursos importantes para a participação de
técnicos na abordagem de temas específicos, bem como para a realização de
projetos integrados. Os serviços podem e devem desenvolver estratégias de apoio
às necessidades da comunidade escolar.
O serviço Disque
Saúde, do Ministério da Saúde, pode ser utilizado gratuitamente pelo telefone
0800 611997 para a realização de pesquisas e resolução de dúvidas por parte de
professores e alunos.
Na Internet, o
acesso à página do Ministério da Saúde pode ser feito através do endereço
eletrônico www.saude.gov.br.
Referências Bibliográficas
BRASIL. Ministério
da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais: apresentação dos temas transversais: terceiro e quarto
ciclos. Brasília, DF, 1998. 1v.
CENTRO BRASILEIRO
DE INFORMAÇÕES SOBRE DROGAS PSICOTRÓPICAS – Cebrid, Unifesp. São Paulo, [19—].
(Série de folhetos sobre drogas psicotrópicas).
DEJOURS, C. Por um
novo conceito de saúde. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, v. 14, n. 54
p. 7-11, abr./maio/jun. 1986.
MARTÍNEZ, A. M. La
escuela: un espacio de promoción de salud. Psicologia Escolar e Educacional,
v.1, n.1, p.19-24, 1996.
Fonte: Texto
Adaptado. O projeto saúde na escola: texto de apoio. Brasília: Ministério da
Saúde: Secretaria de Políticas de Saúde: Projeto de Promoção da Saúde;
Ministério da Educação: Secretaria de Educação a Distância: TV Escola, 2002, p.
7-14.